Há quase meio ano, por dois votos a um, desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça (TJ) decidiram por anular o júri da Boate Kiss, realizado em Porto Alegre, em dezembro de 2021, que durou 10 dias, tornando-se o maior da história da Justiça gaúcha, e condenou os quatro réus. Eles acataram nulidades alegadas pelas defesas e, com isso, os acusados foram soltos, depois de quase oito meses detidos. Contra a anulação do julgamento, o Ministério Público e a Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM) entraram com recurso especial junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e outro extraordinário junto ao Supremo Tribunal Federal (STF). Ambos ainda não foram julgados.
— Os tribunais poderão dar provimento aos recursos, como reverter a decisão da nulidade, ou manter o veredito do TJ, sendo anulado em definitivo o júri e um novo julgamento agendado com novo conselho de sentença — explica Peruchin. — Agora (caso seja mantida a anulação) é novo júri, sete novos jurados, júri com atos renovados, oitivas, debates, repostas aos quesitos dos sete jurados. Tudo será feito do zero até a sentença — acrescenta o especialista.
O TJ informa que o pedido está no Departamento de Recursos aos Tribunais Superiores, que intimou as partes a apresentarem suas respostas. Posteriormente, seguirá para a 2ª Vice-Presidência, para análise de admissibilidade. Nessa etapa, o 2º vice-presidente do tribunal irá analisar a possibilidade dessas apelações seguirem para as cortes superiores, ou seja, STF ou STJ. Não foi divulgada previsão de prazos.
O subprocurador-geral de Justiça para assuntos institucionais do MP, promotor Júlio César de Melo, diz que a posição do órgão está "exaustivamente" demonstrada nos recursos encaminhados a tribunais superiores. Segundo ele, não houve nulidades e, mesmo assim, as mesmas não foram apresentadas no momento oportuno. Portanto, segundo ele, o júri na Capital deve ser mantido. Melo ressalta que o MP ficou perplexo com as nulidades apresentadas no ano passado e aguarda o resultado dos vários recursos interpostos:
— Lamentamos a decisão que reconheceu as nulidades, que não ocorreram em detrimento às defesas. Nós nos solidarizamos com vítimas e familiares que sofrem com esse luto, expressando que vamos empreender todos os eforços para reverter essa decisão inicial e para que os recursos tramitem o mais rápido possível.
Advogado que representa a AVTSM e que também foi assistente de acusação no julgamento anulado, Pedro Barcellos Júnior diz que a entidade esperava que o júri fosse mantido, no máximo com alguma modificação sobre pena ou prisões dos réus.
As defesas dos réus
O advogado Jean Severo, que representa o produtor musical Luciano Bonilha Leão, acredita que o recurso será mantido nas instâncias superiores, reconhecendo as nulidades e anulando o júri. Como ainda está sob análise no TJ gaúcho para ir ou não a Brasília, Severo adianta que irá ingressar com um agravo — recurso contra uma decisão tomada - para garantir o que já foi decidido em agosto de 2022. Ele ressalta que Leão está ansioso, aguardando pela nova decisão.
A advogada Tatiana Borsa, que representa o vocalista da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos, entende que a anulação foi importante por ter refletido o que realmente é "fazer justiça", respeitando os ditames legais. Ela espera que os réus possam enfrentar novo julgamento e diz que seu cliente segue trabalhando, reconstruindo sua vida na expectativa de ser absolvido.
— Que o Ministério Público aceite o resultado da 1ª Câmara do TJ, que é um resultado tecnicamente justo e correto, já que houve a nulidade, e para que, assim, o processo volte para a 1ª Vara do Júri de Porto Alegre, para que o novo julgamento ocorra ainda em 2023 — diz o advogado.