Geral - 09/11/2013 09:50 (atualizado em 30/05/2022 11:20)

Lembranças Eternizadas: A Segunda Guerra Mundial pelas palavras de quem lutou

Ex-combatente que mora em São Miguel do Oeste, faz um relato completo da guerra que matou mais de mil soldados brasileiros
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O veterano de guerra, Lindolfo Arend de São Miguel do Oeste, que bravamente lutou na Segunda Guerra Mundial. - Foto: Camila Pompeo

No dia 1º de setembro de 1939, as forças nazistas alemãs de Adolf Hitler invadiram a Polônia, dando início à Segunda Guerra Mundial. O Brasil passou a participar do conflito a partir de 1942, na época do governo de Getúlio Vargas. A princípio, a posição brasileira foi de neutralidade, mas depois de alguns ataques a navios brasileiros, Getúlio Vargas decidiu entrar em acordo com o presidente americano para dar início à participação do país na Guerra.

Dos quase 25.500 soldados que embarcaram, pelo menos 1.230 morreram em batalha durante os 292 dias de conflito. Hoje, pouco mais de 70 anos desde o início da Segunda Guerra Mundial, a história continua viva na lembrança dos ex-combatentes brasileiros que participaram do conflito.

“ERA DE ARREPIAR SABER QUE ÍAMOS PARA A GUERRA (...)”

 Ex-combatente não atuou nas frentes de batalha, mas acompanhou de perto a atuação dos colegas de farda brasileiros que lutaram e morreram durante o conflito

O primeiro grupo de militares brasileiros chegou à Itália em julho de 1944. O Brasil enviou pouco mais de 25 mil homens da Força Expedicionária Brasileira (FEB), 42 pilotos e 400 homens de apoio da Força Aérea Brasileira (FAB). O objetivo era ajudar os norte-americanos na libertação da Itália, que, na época, estava parcialmente nas mãos do exército alemão. Com 92 anos, Lindolfo Guilherme Arend lembra de cada detalhe da batalha ocorrida nos anos 1940 e conta emocionado o que viu da Guerra.

Na manhã do dia 25 de dezembro de 1944, o jovem Lindolfo, de 25 anos, e os colegas de farda saíram da cidade gaúcha de Santa Cruz do Sul rumo ao Rio de Janeiro onde as tropas foram preparadas. Em fevereiro de 1945, o navio partiu rumo à Itália. Os pais do jovem militar só descobriram o paradeiro do filho quando ele já estava no país italiano. “Era de arrepiar saber que nós íamos para a guerra. Quando chegamos em Napoles, nos arrepiamos e pensamos: “Onde nós fomos nos meter?”. Nós fomos no terceiro escalão, fomos para repor as baixas de militares que haviam sido mortos ou feridos em batalha”, lembra.

Assim que colocaram os pés em solo italiano, a realidade começou a apontar frente aos militares. Com a pressão do exército alemão, a população italiana fugia de suas casas e saía às ruas em busca de alimento e proteção das tropas aliadas. “A trincheira era um lixo. Tinha gente maltrapilha pedindo comida, pedindo cigarro. Não tenho nem como explicar, era uma miséria. Foi muito triste chegar em um ambiente daquele”, relata.

Lindolfo não atuou nas frentes de batalha, mas trabalhou no depósito pessoal das tropas brasileiras. As tropas precisavam estar sempre completas para atuarem contra o exército inimigo, por isso, quando alguns soldados morriam ou eram feridos, outros eram convocados para os substituir. “Nós éramos da Centro de Recompletamento. O efetivo precisava estar completo então quando havia baixa na tropa, eles iam nos buscar. Mas eu tive muita sorte porque quando cheguei, me colocaram na administração do depósito. Eu era bom nisso, mas participei ativamente de instruções e aprendi a manusear novas armas”, conta.

Nos quase 300 dias de conflito, muitos homens integrantes das tropas brasileiras morreram. Porém, na época, os soldados brasileiros não encontravam tempo sequer para sentir medo da morte. “Medo de bala ninguém tinha. A gente estava lá, então não adiantava ficar triste. Precisávamos ficar com a cabeça erguida”, afirma.

O longo período o qual os militares precisaram ficar longe da família motivava alguns a escrever cartas. Muitos, no entanto, deixaram de escrever por conta da rígida censura imposta durante a guerra. “As cartas passavam pela censura. Qualquer palavra que eles não gostassem, eles cortavam. Eu nunca escrevi para os meus pais”, explica.

Na sala de administração, os militares controlavam com a ajuda de um mapa, o avanço das tropas brasileiras no território italiano. Com a chegada do inverno, as tropas não saiam da posição e utilizavam artilharia pesada para bombardear-se à distância. “Nos bombardeamos pela artilharia. O gelo tomou conta. Tinha neve de 60 cm a 80 cm de altura, por isso ninguém saía. Quando o gelo começou a derreter, a coisa foi para frente. O Monte Castelo era intransponível”, enfatiza.

Questionado sobre o momento mais difícil em toda a Segunda Guerra, Lindolfo não hesita em responder. “Foi a tomada do Monte Castelo, pois na primeira tentativa, as nossas tropas fracassaram”, justifica.  A batalha do Monte Castelo foi travada entre as tropas aliadas e o Exército alemão, no final da guerra. O objetivo era conter o avanço dos alemães pelo Norte da Itália. Durante a batalha, que durou cerca de três meses, foram efetuados diversos ataques. Muitos soldados não resistiram ao frio e as armas de grosso calibre do Exército alemão.

Os militares integrantes da Força Expedicionária que morriam durante a batalha, eram sepultados no Cemitério de Pistoia, na Itália. “No Monte Castelo perdemos muitos soldados. De um pelotão de 48 soldados, voltaram 17. O resto morreu e só foi encontrado depois que o gelo derreteu. Conhecemos eles apenas por conta da placa de identificação que eles traziam junto ao peito. Perdi muitos amigos também na guerra e só descobri quando fomos visitar o cemitério brasileiro na Itália e encontramos as plaquetas na cruz”, relata.

Em setembro de 1945 chegava ao fim a Segunda Guerra Mundial. Estados Unidos e os aliados saiam vencedores no conflito que matou cerca de 60 milhões de pessoas, entre civis e militares. Enquanto muitas tropas se preparavam para voltar para o Brasil outras, continuavam em solo italiano trabalhando em combate a qualquer tipo de doença. “Os americanos eram muito exigentes, não queriam deixar doenças para trás. Nós íamos de casa em casa procurar o mosquito da malária. Onde achávamos um foco do mosquito, colocávamos veneno dentro e acabávamos com ele”, lembra.

Na volta ao Brasil, os expedicionários foram recepcionados calorosamente pela população brasileira e pelas famílias que aguardavam ansiosas por notícias. A festa de recepção durou dias no Rio de Janeiro, na época Capital da República. “No Brasil a recepção foi muito bonita, os familiares estavam esperando. Eu não tinha familiar presente, por isso fiquei assistindo. Estava feliz porque tinha voltado”, revela.

Cerca de três anos depois do fim da Guerra, Lindolfo, conheceu a esposa e se casou. O casal teve um filho e passou a viver do dinheiro que a produção rural rendia. Hoje eles vivem em São Miguel do Oeste. Ao lado da esposa e bem pertinho do fogão à lenha, seu Lindolfo revela que a vida foi generosa, mas que ainda tem muito o que viver. “Nossa vida não foi folgada, nem apertada. O que dá para dizer é que vivemos bem nesses anos todos. Apesar da minha idade, tenho saúde de ferro, pretendo viver mais alguns anos”, conclui.

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Fonte: Camila Pompeo / Jornal O Líder
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