O levantamento foi feito com base em dados das secretarias estaduais de segurança pública. Foram compiladas informações sobre maus-tratos, lesão corporal dolosa, exploração sexual, estupro e mortes violentas intencionais. Os crimes tiveram como vítimas pessoas com e 0 a 17 anos.
Somando as informações dos 12 estados foram registrados 24.761 casos de violência contra crianças e adolescentes no 1º semestre de 2021. O crime de maus-tratos é o segundo com maior notificação no país — fica atrás apenas do estupro. Foram 4.389 ocorrências no período.
Santa Catarina liderou os casos com taxa de 47,7%. Foram 784 notificações ao longo de seis meses. No Brasil, o perfil das vítimas desse tipo de crime é crianças com 10 a 17 anos (52%), do sexo feminino (77%) e brancas (51%).
No crime de lesão corporal no contexto de violência doméstica Santa Catarina também tem o pior indicador. A taxa catarinense é de 38,6%, enquanto o segundo lugar, ocupado pelo Mato Grosso do Sul, é de 29,3%.
Subnotificação preocupa
Para o coordenador do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude (CIJ) do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), promotor de Justiça João Luiz de Carvalho Botega, é preciso considerar a subnotificação de casos e a estrutura catarinense para receber denúncias ao analisar os dados do Fórum.
A falta de um sistema unificado de dados de segurança pública dificulta, em sua visão, a comparação precisa dos dados de Santa Catarina e outros estados.
— Sempre temos que olhar com cuidado para esses dados de segurança pública porque também são coletados de forma muito esparsa, sem uma padronização — comenta Botega.
Botega diz também que a estrutura montada em Santa Catarina para receber denúncias pode justificar os números mais altos.
— Santa Catarina tem uma rede mais estruturada com o que faz com que mais casos cheguem às unidades, seja por meio de denúncias da população, no Disque 100, conselho tutelar — afirma.
O próprio Fórum Brasileiro de Segurança Pública destaca no levantamento a importância de um sistema unificado para a notificação de casos. Segundo a instituição, o preenchimento dos boletins de ocorrência difere em cada estado e em alguns casos deixa de forma importante informações importantes como a idade das vítimas.
Cultura de violência
Mesmo com esses fatores, o promotor João Luiz de Carvalho Botega diz que os números refletem aspectos culturais que ainda precisam ser combatidos. Um deles, relacionado a lesão corporal no contexto da violência doméstica, é a punição física as crianças.
— Ninguém acha que bater num adulto ou num animal vai resolver o problema. A gente às vezes naturaliza a violência contra crianças e os maus-tratos recaindo sobre elas essa questão cultural — diz.
Uma ação diretamente relacionada a esse tipo de violência, segundo Botega, foi a criação da “ Lei do Menino Bernardo”, também chamada de “Lei da Palmada”. A nomenclatura faz referência a morte de Bernardo Boldrini, em 2014. A criança de 11 anos morreu depois de receber uma superdosagem de um medicamento. Pai, madrasta e uma amiga do casal foram condenados pelo crime.
A lei considera crime o castigo físico aplicado como ação de natureza disciplinar ou punitiva contra crianças e adolescentes. Ela alterou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e determina que pais e responsáveis que agridam para correção sejam advertidos e encaminhados ao programa oficial de proteção à família, tratamento psicológico ou psiquiátrico, e programas de orientação.