EM SESSÃO SOLENE - 20/12/2023 23:17

Reforma tributária é promulgada após mais de três décadas de discussão; veja o que muda

Evento marcou, de forma oficial, a inscrição das novas regras para impostos sobre o consumo na Constituição do país
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Presidentes da Câmara, Arthur Lira, do Senado, Rodrigo Pacheco, e da República, / Lula Ricardo Stuckert / Palácio do Planalto

A reforma tributária, aprovada na última sexta-feira (15) na Câmara dos Deputados, foi promulgada nesta quarta-feira (20) em sessão solene do Congresso Nacional, realizada no plenário da Câmara. O evento marcou, de forma oficial, a inscrição das novas regras para impostos sobre o consumo na Constituição do país, após mais de 30 anos de debates.

A sessão solene contou com a presença dos presidentes dos três poderes: Luiz Inácio Lula da Silva, do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco, e do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também participou da cerimônia. 


— Este dia será marcado para história. É um divisor de águas. É o Brasil rumo ao progresso. É uma conquista do Congresso Nacional, uma conquista do povo brasileiro — afirmou Pacheco, ao promulgar a emenda.

O presidente do Senado afirmou ainda que a reforma tributária é resultado do "diálogo democrático" e representa "a força da democracia brasileira".

— Fomos capazes de superar as incertezas. Fomos capazes de superar as dificuldades do processo, de fazer valer os princípios democráticos, de dialogar com a sociedade, com o governo, com os agentes públicos, com os agentes privados— disse Pacheco. 

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), elegeu a reforma tributária como a principal conquista de seus mandatos à frente da Presidência da Casa. 

— A reforma tributária promulgada hoje (quarta-feira) não nasceu de um ato autoritário de um poder ou da vontade de um governo. E sim de uma intensa negociação política, de um diálogo permanente entre nós, parlamentares, com diversos setores da sociedade brasileira — afirmou o presidente da Câmara.

Lula afirmou que o texto não vai resolver todos os problemas, mas é a demonstração de um Congresso independente:

 — Foi a demonstração de que esse Congresso Nacional, independente da postura política de cada um, do partido, esse Congresso toda vez que teve que mostrar compromisso com o povo brasileiro, ele mostrou.

Aprovada na sexta-feira, a PEC recebeu 371 votos favoráveis e 121 contrários no primeiro turno, enquanto foram 365 pela aprovação e 118 pela rejeição na segunda votação na Câmara dos Deputados.

Ao longo do próximo ano, o Congresso terá de votar leis complementares para regulamentar a reforma tributária. Segundo o ministro da Fazenda, os projetos serão enviados nas primeiras semanas de 2024.

Mas o que muda?

A reforma tributária unifica impostos sobre o consumo em um Imposto sobre Valor Agregado (IVA). O IVA será dual: um para os impostos estaduais, outro para os federais. A alíquota do IVA ainda não está definida. 

Será assim:

Três tributos federais — PIS, Cofins e IPI — dão origem à Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal.

O ICMS (estadual) e o ISS (municipal) serão unificados no formato do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com gestão compartilhada entre Estados e municípios.

O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) inicialmente seria extinto, mas continuará a existir, incidindo sobre produtos concorrentes dos produzidos na Zona Franca de Manaus.

O princípio da reforma é deslocar a cobrança do imposto da origem — onde a mercadoria é produzida — para o destino — onde é consumida. 

A diferença, segundo os defensores do texto, é que o modelo vai ficar mais simples e a cobrança será mais eficiente. Hoje, o modelo tributário brasileiro é considerado caótico e gerador de distorções.

Com uma longa lista de exceções e de alíquotas especiais, o novo sistema tributário terá impactos variados conforme o setor da economia. Pela primeira vez na história, haverá medidas que garantam a progressividade na tributação de alguns tipos de patrimônio, como veículos, e na transmissão de heranças.

Imposto Seletivo

A reforma prevê a criação de um Imposto Seletivo, de competência federal, sobre bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, caso dos cigarros e das bebidas alcoólicas. Por isso, foi apelidado de "imposto do pecado".

Armas e munição também seriam taxadas pelo Imposto Seletivo. Mas esse trecho foi barrado pelos deputados na votação dos destaques — sugestões de alteração do texto — no segundo turno. Os detalhes da cobrança e dos produtos que serão desestimulados pelo imposto serão definidos posteriormente, em uma lei complementar.

Cesta básica

Um dos itens que mais gerou polêmica na reforma foi a tributação da cesta básica. O Senado havia criado duas listas de produtos. A primeira com a cesta básica nacional, destinada ao enfrentamento da fome. Essa cesta terá alíquota zero e poderá ter os itens regionalizados por lei complementar.

Os senadores haviam criado uma segunda lista, chamada de cesta básica estendida, com alíquota reduzida para 40% da alíquota-padrão e mecanismo de cashback — devolução parcial de tributos — a famílias de baixa renda. O relator da reforma na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) retirou essa lista, sob o argumento de que boa parte dos alimentos é beneficiada pela alíquota reduzida para insumos agropecuários.

O cálculo sobre o impacto final só poderá ser feito quando a reforma tributária entrar em vigor. A tendência é de que itens mais industrializados, com cadeia produtiva mais longa, tenham redução maior de preços. Alimentos in natura ou pouco processados deverão ter leve redução ou até leve aumento porque terão poucos créditos tributários.

Remédios

O texto aprovado prevê a alíquota reduzida em 60% para medicamentos e produtos de cuidados básicos à saúde menstrual. O Senado incluiu na lista de alíquota reduzida produtos de nutrição enteral e parenteral, que previnem ou tratam complicações da desnutrição.

Segundo especialistas, a reforma não deverá trazer grandes impactos sobre o preço dos remédios. Isso ocorre por dois motivos. Primeiramente, os medicamentos genéricos estão submetidos a uma legislação específica. Além disso, a Lei 10.047, de 2000, estabelece um regime tributário especial a medicamentos listados pelo Ministério da Saúde.

O Senado também incluiu na isenção de IVA a compra de medicamentos e dispositivos médicos pela administração pública e por entidades de assistência social sem fins lucrativos. A Câmara dos Deputados tinha zerado a alíquota para medicamentos usados para o tratamento de doenças graves, como câncer.

Combustíveis

A reforma tributária estabelece um regime de tratamento diferenciado para combustíveis e lubrificantes. Durante a tramitação no Senado foi incluída a possibilidade de cobrança do Imposto Seletivo, tributo sobre produtos que gerem danos à saúde e ao meio ambiente, sobre combustíveis e petróleo (para a extração de petróleo e de minérios, haveria alíquota de 1%). Durante a votação na Câmara, o PSOL tentou elevar essa alíquota, mas os deputados derrubaram o destaque.

Segundo o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), o regime diferenciado levará a uma forte alta do preço final aos consumidores. Especialistas afirmam que o impacto é incerto porque muitos pontos do regime diferenciado para os combustíveis serão definidos por lei complementar e a reforma prevê a possibilidade de concessão de créditos tributários. 

Veículos

A cobrança de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) passará a incidir sobre veículos aquáticos e aéreos, como jatos, helicópteros, iates e jet ski. A reforma também estabelece que o imposto passará a ser progressivo conforme o impacto ambiental do veículo. Automóveis movidos a combustíveis fósseis pagam mais. Veículos movidos a etanol, biodiesel e biogás e os carros elétricos pagarão menos IPVA.

O Senado acatou uma emenda da senadora Mara Gabrilli (PSD-SP) e incluiu a compra de automóveis por taxistas e pessoas com deficiência e autismo entre os itens com alíquota zero. O benefício existe atualmente e seria extinto com a reforma tributária.

Em julho, durante a primeira votação na Câmara, os deputados criaram uma lista de exceção para evitar a cobrança sobre veículos usados para a agricultura e para serviços. A relação abrange os seguintes tipos de veículos: aeronaves agrícolas e certificadas para prestar serviços aéreos a terceiros; embarcações de pessoa jurídica com outorga de serviços de transporte aquaviário; embarcações de pessoa física ou jurídica que pratique pesca industrial, artesanal, científica ou de subsistência; plataformas que se locomovam na água sem reboques (como navio-sonda ou navio-plataforma); e tratores e máquinas agrícolas.

Heranças

O texto também estabelece uma cobrança progressiva do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), em razão do valor da herança ou da doação. Pela proposta, a cobrança será feita no domicílio da pessoa falecida. A medida tem o objetivo de impedir que os herdeiros busquem locais com tributações menores para processar o inventário. O projeto cria regra que permite cobrança sobre heranças no Exterior.

Como será a transição

- 2026
Início da cobrança da CBS e do IBS, com alíquota de teste de 0,9% para a CBS e 0,1% para o IBS
- 2027
Extinção do PIS/Cofins e elevação da CBS para alíquota de referência (a ser definida posteriormente pelo Ministério da Fazenda)
Redução a zero da alíquota de IPI, exceto para itens produzidos na Zona Franca de Manaus
- 2029 a 2032
Extinção gradual do ICMS e do ISS na seguinte proporção:
90% das alíquotas atuais em 2029
80% em 2030
70% em 2031
60% em 2032
- 2033
Vigência integral do novo sistema e extinção dos tributos e da legislação antigos 
- 2029 a 2078
Mudança gradual em 50 anos da cobrança na origem (local de produção) para o destino (local de consumo).
Fonte: Gaúcha/ZH
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