A série pós-apocalíptica The Last of Us, baseada no videogame homônimo de sucesso, mostra a luta pela sobrevivência de Joel e Ellie em meio aos infectados pelo fungo Cordyceps.
Na trama da série distópica, o fungo se alastrou por toda a espécie humana e os poucos que não foram atingidos precisam se proteger dos infectados, que vivem como verdadeiros zumbis. A grande curiosidade é que Cordyceps é um fungo que existe e pode, inclusive, ser encontrado no Brasil.
O gênero do ser vivo é conhecido pela interação com os artrópodes (que incluem insetos, aracnídeos, crustáceos, entre outros), na qual se manifestam como endoparasitas. Ou seja: vivem dentro do corpo desses animais.Um caso bastante assustador é o das formigas com a espécie Ophiocordyceps unilateralis sensu lato, que realmente são transformadas em uma espécie de zumbi. Isso porque o parasita infecta o hospedeiro e atinge todo seu sistema nervoso, que é consumido ao longo do desenvolvimento do fungo, mas mantém as atividades cerebrais e instintivas.
Humanos convivem com esse fungo de maneira natural, assim como outras espécies do reino Fungi. Apesar disso, a série traz à tona a dúvida: seria possível que a ficção se torne realidade?Uma pandemia já não é um termo incomum e nem distante para espécie humana, que já enfrentou diversas disseminações mundiais de novas doenças, como a mais recente da Covid-19.
Os humanos já são contaminados por fungos através da inalação de estruturas fúngicas, por implantação (contato direto com a pele) ou por secreção contaminada. Muitos quadros de contaminação podem ter resolução espontânea, em outros casos é necessário intervenção terapêutica e alguns podem até levar a óbito.
Mas, para o Cordyceps infectar os seres humanos como mostrado na série,seria necessária uma espécie de mudança no perfil desse gênero.“Para parasitar humanos, seria necessária uma mudança no perfil de infecção do fungo, o que poderia acontecer com mudanças climáticas", explica o pesquisador do Laboratório de Taxonomia, Bioquímica e Bioprospecção de Fungos do Instituto Oswaldo Cruz, Manoel Marques Evangelista de Oliveira, em entrevista ao R7.
"O fungo teria que se adaptar a temperatura do corpo humano. Portanto o fungo que não cresceria a temperatura do corpo humano, próximo de 37°C, pode passar vir crescer nessa temperatura — podendo infectar os seres humanos”, completa o pesquisador.Para que o fungo se desenvolva e se torne um parasita, é necessário que esteja em ambientes propícios para ele, por isso a necessidade de uma alteração na estrutura do Cordyceps para soberviver como parasita nos humanos.
Existe chance dessa evolução acontecer, a gente não pode negar essa capacidade do fungo de se adaptar e sofrer mudanças. Nós temos estudos em que observamos o desenvolvimento do fungo em temperaturas extremas ou índices extremos de pH [potencial hidrogeniônico]. Mas não conseguimos prever quando isso pode acontecerr, mas é uma possibilidade”, afirma o pesquisador.
Apesar de demonstrar grandes capacidades de evolução, o pesquisador ressalta que não é possível ter certeza que ele se tornaria um parasita da espécie humana caso alcançasse tal estágio.Porém, as chances de uma mudança de perfil no Reino Fungi não são tão distantes quanto parece, já que o ecossistema da Terra passa por mudanças recentes significativas.
“É importante destacar que muitas vezes as mudanças podem ser aceleradas pela degradação do ser humano no meio ambiente. Então temos que ter cuidado em conter esse avanço do nosso clima para que possamos evitar o surgimento de fungos com perfil patogênico”, alerta Manoel.
Mesmo com a incerteza de infecções como as que ocorrem com as formigas afetadas pelos “fungos-zumbi”, o pesquisador aponta que esses insetos já possuem uma resposta imune ao Cordyceps.“Já tem estudos que demonstram uma resposta imune das formigas frente a esse fungo. Vemos que é um fungo que já tem uma capacidade de ativar uma resposta frente a sua infecção”, exemplifica o cientista.