Documento apresentado durante audiência pública demonstra variação de até 500% no preço do mesmo soro fisiológico.(Foto: Divulgação)
O risco de faltar soro fisiológico para procedimentos de hemodiálise no Brasil foi pauta da audiência pública da Comissão de Seguridade Social e Família na Câmara dos Deputados, em Brasília, na terça-feira (12). Hospitais e clínicas alegaram que pacientes com insuficiência renal podem ser comprometidos pelo desabastecimento do produto. A Secretaria de Estado da Saúde (SES) afirmou que está conseguindo manter seus estoques de insumos hospitalares.
A Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplantes (Abcdt) e da Associação dos Centros de Nefrologia de Santa Catarina (Ascene) enfatizaram que há muita dificuldades para adquirir soro fisiológico e o preço do produto no mercado chegou a subir 500% nos últimos seis meses.
Tarcísio Steffen, presidente da Ascene, relatou que a situação vem se agravando desde o fim de 2021 e que as entidades estão cobrando providências urgentes das autoridades públicas federais e estaduais há meses.
Representantes do Ministério da Saúde, presentes na audiência, afirmaram que a pasta também enfrentou problemas para adquirir o produto recentemente. O insumo seria distribuído para estados e municípios.
— Não há hemodiálise sem um insumo tão básico quanto o soro fisiológico, mas para se ter ideia, a maior parte das clínicas de Santa Catarina e, segundo relatos do Brasil, já está diluindo cloreto de potássio com água destilada a fim de fazer as sessões de hemodiálise — alegou Steffen.
Durante a sessão, o presidente da Ascene exibiu cópias da troca de mensagens com fornecedores relatando não ter o produto para pronta entrega. Além disso, acrescentou que também há dificuldades no fornecimento de água destilada.
Alta nos preços
Arcar com o aumento nos preços do insumo é outra dificuldade das clínicas e hospitais. Documentos apresentados na audiência pública indicaram a alta no valor de bolsas de mil ml de soro fisiológico muito acima da inflação, chegando até em 500%
Até o fim de outubro de 2021, o produto custava por volta de R$ 4,01. Em meados de abril, atingiu o preço de R$ 25. Desde então, os preços estão variando, mas sempre com valor acima dos R$ 21.
— Este aumento absurdo gerou um problema para as clínicas. Ou vai faltar soro ou vai ficar financeiramente inviável as clínicas continuarem atendendo aos pacientes já em tratamento — acrescentou o presidente da Ascene.
Stefan relatou que, mesmo disposta a pagar os preços atualmente cobrados, a empresa em que trabalha passa por dificuldades para repor cerca de 12 mil bolsas de soro que utiliza mensalmente.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Soluções Parenterais (Abrasp), André Francisco Ignácio, reconheceu a alta dos preços, embora não nos patamares citados.
O aumento, segundo ele, está ligado a causas complexas, como a desvalorização do real frente ao dólar, dificuldades logísticas e a dependência de matéria-prima importada.
Entretanto, Ignácio assegurou que os fabricantes nacionais de soros não reduziram o ritmo de produção.
— Temos, por exemplo, uma cadeia globalizada de fornecimento de IFA [ingredientes farmacêuticos ativos] concentrada em pouquíssimos países. Alguns estudos, inclusive desta própria Casa [Câmara], concluíram que o principal problema do complexo industrial brasileiro de saúde é a dependência externa. Houve um desmanche da indústria brasileira ligada a medicamentos, principalmente dos insumos. Esta dependência externa gera os dois principais problemas que estamos sentindo hoje: a indisponibilidade de determinadas substâncias e o preço altíssimos de outros itens disponíveis para a compra — disse o presidente da Abrasp.
Soluções para o desabastecimento
Ao fim da audiência, o secretário-executivo da Câmara de Regulação de Mercado de Medicamentos, Romilson Volotão, se comprometeu a investigar as denúncias de sobrepreço que foram formalizadas pelas clínicas à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Nos próximos sete dias, as entidades participantes do debate definirão um cronograma para reuniões de trabalho a fim de tentar achar uma solução para o problema.
— Este tema é muito preocupante. A falta de medicamentos já está sendo registrada em 12 estados brasileiros. Quando há falta, enfrentamos também o sobrepreço. Por isso, precisamos compreender o que está causando esta falta de insumos estratégicos que não podem ser substituídos por outros produtos. E precisamos de uma tomada de decisões urgente, pois com estes preços, é praticamente impossível adquirir estes produtos — reforçou a deputada catarinense Carmen Zanotto.
Situação em Santa Catarina
Apesar das dificuldades de aquisição enfrentadas em todo território nacional, a Secretaria de Estado da Saúde (SES) afirmou que está conseguindo manter seus estoques de insumos hospitalares.
"Os estoques das soluções parenterais de grande volume, soros e contrastes não estão em falta. Algumas apresentações das Soluções Parenterais estão sendo substituídas por outras. Na última quinta-feira, a SES recebeu uma nova carga de soro", disse por nota.
A secretaria também disse que tem recebido solicitação de empréstimo de unidades filantrópicas e que sempre que possível, respeitando os estoques, está auxiliando. Além das atas de compra que estão em aberto, o Estado poderá realizar a aquisição de forma emergencial, caso seja necessário.